QUEM MANDA MAIS O MARIDO OU A ESPOSA?
Quem manda mais? Pergunta um tanto invasiva, mas tem a finalidade de conhecer melhor a hierarquia do casal.
Depois da luta pela emancipação feminina a mulher conquistou poderes incríveis, ou pelos menos, melhor reconhecidos atualmente. Porém, trouxe uma sobrecarga de atividades. São três jornadas por dia, casa, trabalho, filhos e muitas continuam os estudos.
Ouvimos das mulheres que elas que mandam em casa, e não só delas. O poder da família fica em suas mãos. Claro que gostariam de partilhar com o respectivo a divisão das tarefas domésticas e compartilhar decisões necessárias do dia a dia, mas quem pode contar com o marido?
Os maridos se defendem dizendo que sequer são consultados sobre estas questões diárias, quando se dão conta, tudo já foi resolvido. Ao tentar ajudar são criticados: pelo que fazem, como fazem, quanto demoram e o quanto gastam. Isso faz com que se sintam inaptos para os assuntos domésticos e o cuidado com os filhos. Se convencem rapidamente que isso é coisa de mulher, e voltam confortáveis para seu espaço.
A mulher alega não ter paciência com a demora do marido, até para trocar uma simples lâmpada, o marido por sua vez, responde: “não se passaram nem seis meses e você já está cobrando?”.
Geralmente, quem mais fala é quem mais manda, com isso os homens falam no primeiro ano do casamento e a mulher escuta, no segundo ano a mulher fala e o homem escuta e no terceiro ano os dois falam e os vizinhos escutam, quebrando a barreira do som portão a fora.
Certamente melhor seria que marido e esposa compartilhassem essa autoridade em casa, conversassem para realinhar regras que não foram acordadas e transmitissem aos filhos que a autoridade na casa pertence igualmente ao papai e a mamãe. Precisam redefinir padrões para que orientem de forma uniforme seus filhos, sem desautorizar o outro, e inclusive abaixar o tom de voz, em pelo três tons. Desta forma, vão possibilitar aos filhos que cresçam com alicerces firmes e terão a saúde mental preservada.
Não tem segredo, porém, isso só acontecerá se o casal aprender novas formas de se comunicar. Obter permissão para falar, sem restrições. Sabemos que nem tudo que se fala se faz e nem tudo o que se faz se fala. A ideia é evitar trivialidades e falar aberta e honestamente sobre o que realmente lhes faça sentido, suas dores, cansaços, injustiças e humilhações enfrentadas no dia a dia. Partilhar com o outro onde mais lhes dói, acreditando que não será julgado, sentenciado e executado, antes será confirmado pelo seu par, sabendo que tem com quem contar, caso algo dê errado.
Apesar do segredo de um casamento feliz ainda continuar sendo um segredo, não se rendam. Outro dia lendo um artigo do Luis Fernando Veríssimo[1], ele contava que descobriu o segredo para ter uma casamento feliz e duradouro: Duas vezes por semana, ele e a esposa iam a ótimos restaurantes, com uma comida gostosa, uma boa bebida e boas companhias: “ele ia às terças-feiras e ela, às quintas-feiras”. E que passaram agora dormir em camas separadas: “a dela era em Fortaleza e a dele em SP”.
Lembram-se da música como nossos pais[2], então continua bem atual. Trazemos para a vida adulta modelos de comunicação que aprendemos com nossos pais. Se pai e mãe tinham uma relação confusa, imprecisa e contraditória, vamos aprender a nos comunicar também de forma confusa, imprecisa e contraditória, incluindo gritos, indiretas, dramatizações e demais caras e bocas.
Essa herança familiar nos acompanhará na vida adulta. É um modelo de comunicação disfuncional e a tendência é repetirmos com nossa família nuclear, marido, esposa, filhos, na família ampliada e nas demais relações sociais. Podemos questionar: será que não têm formas menos insanas de conversar com nossos entes queridos? No entanto, até romper com este modelo “tóxico” e encontrar formas mais afetuosas de comunicação, demonstrando mais nossos sentimentos; continuaremos transmitindo para futuras gerações. Fato é que os filhos não fazem o que os pais falam, só fazem o que os pais fazem.
No entanto, não é só esse padrão de comunicação que herdamos, repetimos também padrões de comportamentos que tínhamos lá na velha infância[3] (atual tanto quanto).
Vamos refletir: se na casa dos pais de uma jovem esposa quem manda é sua mãe, a filha deverá repetir o mesmo modelo com seu marido. Da mesma forma, se na família do rapaz a mãe dele que é a autoridade maior, ele deverá buscar uma esposa com o mesmo perfil da mãe. Portanto, é previsível, quem vai mandar e quem vai obedecer (se juízo houver) na casa deste jovem casal.
É claro que essa pauta transmitida de pais para filhos não é determinante e nem profética; se trata de algo inconsciente, mas é bom lembrar que quanto mais as reconhecermos mais evitamos repetir no presente padrões que não deram certo no passado. Filtrar os valores e princípios que foram repassados por nossas famílias é preventivo e serve como proteção para nossos descendentes. Melhor preservar na vida adulta somente os legados significativos: responsabilidade, honestidade, amor, bondade, e divertimento que existem, de certa forma, em todas as famílias.
Neste século XXI a velocidade das mudanças se acentua rapidamente, estamos em constante transição, mudanças nunca sequer vistas impõe atualizações diárias. As relações afetivas são construídas na convivência com o outro dia a dia. Mudanças familiares incidiram de forma significativa na inversão da autoridade patriarcal e nas divisões dos papéis conjugais e parentais, e reivindicam mais igualdade. O exercício da autoridade, antes predeterminado, que levava a grandes competições entre o casal, agora se tornou objeto de constantes negociações.
A igualdade na relação traz resultados práticos e rápidos: melhora o bem-estar, promove harmonia, saúde e reaproxima o casal em sua intimidade. Como a intimidade se tornou mais significativa na atualidade, a igualdade no relacionamento se tornou mais necessária.
A intimidade se baseia em duas pessoas que têm a capacidade de ouvir e de falar, que têm a coragem de trazer cada vez mais de si na relação. Tem permissão de falar sobre o que fazem, o que pensam e o que sentem fortalecendo a conjugalidade. O casal precisa de igual poder para construir um futuro juntos, trocando as competições e lutas de poder por companheirismo e cumplicidade[4].
As relações afetivas precisam encontrar maior equilíbrio na ordem da justiça humana, quando entre o casal um se sobrepõe ao outro, um deles se sentirá emocionalmente lesado. A sensibilidade ao parceiro(a) é o que faz com que a relação pareça justa. O trabalho doméstico e os deveres com filhos nem mesmo precisam ser divididos meio a meio. A relação necessita somente parecer justa. E isso exige flexibilidade e sensibilidade às emoções[5].
Portanto, estar atento ao que agrada ou incomoda o outro é uma forma de respeito e cuidado. O respeito na divisão de tarefas, na tomada de decisão conjunta e na licença de poder se manifestar honestamente um com o outro. As pessoas podem aceitar uma divisão desigual do trabalho, desde que se sintam legitimadas como pessoas de valor e não desprezadas. Desta maneira, quando se tem compreensão, interesse, a sociedade conjugal resistirá aos obstáculos em todo percurso da vida a dois.
[1] VERÍSSIMO, L.F., Desabafo de um bom marido. Disponível em:
https://www.recantodasletras.com.br/humor/1512866
[2] Música de Belchior: Como nossos pais, 1976.
[3]Música dos Tribalistas: Nossa velha infância, 2002.
[4] LERNER, H. G. A Ciranda da Intimidade, Ed. Best Seller, 1989.
[5] SCHWARTZ, R. C. Terapia Familiar: conceitos e métodos. 7. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2007.